terça-feira, 1 de abril de 2014

50 anos do Golpe Militar: Em 2 de abril de 1964, Congresso declarou vaga Presidência da República.

Em 2 de abril de 1964, Congresso declarou vaga Presidência da República.
Argumento foi o de que presidente Goulart havia abandonado o governo.
 
 
 
a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, desencadeou uma série de fatos que culminaram em um golpe de estado em 31 de março de 1964. O sucessor, João Goulart, foi deposto pelos militares com apoio de setores da sociedade, que temiam que ele desse um golpe de esquerda, coisa que seus partidários negam até hoje. O ambiente político se radicalizou, porque Jango prometia fazer as chamadas reformas de base na "lei ou na marra", com ajuda de sindicatos e de membros das Forças Armadas. Os militares prometiam entregar logo o poder aos civis, mas o país viveu uma ditadura que durou 21 anos, terminando em 1985
Ex-deputados relatam bastidores da sessão que depôs João Goulart
 
  • .“Até hoje persiste a ideia de que o golpe de estado de 64 se configurou no dia 31 de março. Como isso se deu, não consigo entender, mas a imprensa botou, outros acharam que era dia 1º de abril e, até agora, não se conseguiu criar a verdade história. O golpe aconteceu no dia 2 de abril”, defende o ex-ministro do Trabalho e da Previdência Social de Goulart, que foi um dos últimos que se despediu de Jango rumo a Porto Alegre e ao exílio no Uruguai, pouco antes da sessão que o depôs.
  • A maioria dos deputados e senadores presentes foi surpreendida na noite do dia 1º e no início da madrugada do dia 2 pela convocação, por telefone, para uma sessão extraordinária na qual – saberiam depois – o presidente do Congresso, senador Auro de Moura Andrade, declararia vaga a Presidência da República, sob o argumento de que Jango havia abandonado o governo.
  •  O então presidente, ameaçado nos dois dias anteriores pela movimentação das tropas comandadas por chefes militares contrários ao governo, tinha viajado para o Rio Grande do Sul.
  • O ex-deputado pernambucano Ney Maranhão, 86 anos, em 1964 no Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o mesmo de Jango, relembra do "rebuliço danado" que provocou a convocação extraordinária do Congresso. "Fomos convocados às pressas, para uma sessão às 2h da madrugada. Eu, particularmente, já sabia o que estava acontecendo, pelo que estava se desenhando", disse.
  • Antes de a sessão se iniciar, Leopoldo Peres Sobrinho, 84 anos, então deputado pelo Amazonas do Partido Social Democrático (PSD), diz ter presenciado uma reunião "secreta" no gabinete de Auro Moura Andrade, que apoiava o golpe militar e defendia a destituição de Goulart.
  • “Talvez eu fosse o mais novo integrante dessa reunião e sou um dos poucos que sabem do que se passou no gabinete [...]. Vi quando Auro de Moura Andrade chamou o Gustavo Capanema, que era um homem culto e um dos grandes juristas do país, falando-lhe algo no ouvido, cochichando. Capanema saltou e disse em voz alta: 'Auro isso é um absurdo. Mas vou fazer para evitar derramamento de sangue'”, contou.
  • Segundo Peres Sobrinho, os parlamentares convocados para a sessão desconheciam as intenções de Moura Andrade e não sabiam o que exatamente ele iria anunciar.
  • Ao chegar ao Congresso, o deputado Plinio de Arruda Sampaio, 83 anos, na ocasião integrante da bancada paulista do Partido Democrata Cristâo (PDC), diz ter percebido uma "tensão brutal".
  • “O clima estava uma coisa terrível [...]. Deputados golpistas e deputados do Jango ofendendo, um botando o dedo na cara do outro, era coisa quase de soco. Revólver na cinta, todo mundo com revólver aparente. Clima tensíssimo. Uma sessão violentíssima”, contou Sampaio, 83 anos, atualmente filiado ao PSOL.
  • Durante a sessão, alguns deputados abasteciam de informações o ex-presidente Juscelino Kubitscheck, que acompanhava com ansiedade os acontecimentos. “Juscelino estava preocupadíssimo”, afirma o ex-deputado Carlos Murilo, do PSD de Minas, primo do ex-presidente. Murilo, que se disse "homem de confiança" de Juscelino, afirmou ter passado a madrugada entre o Congresso e o apartamento do ex-presidente.
  • “Eu e o Renato Azeredo (PSD) [pai do ex-deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG), processado no caso do mensalão tucano em Minas], estávamos no apartamento de Juscelino em Brasília. Tinha muita gente lá, falando alto [...]. Passei a noite indo e voltando do apartamento do Juscelino, passando informações”, declarou Murilo, que se recorda da preocupação de parlamentares da esquerda, com medo de serem presos.
  • Ex-ministro do Trabalho e da Previdência do governo Jango e na época deputado do PTB pelo Amazonas, Almino Affonso, 84 anos, afirma que, logo depois de Moura Andrade anunciar que a Presidência estava vaga e que o presidente da Câmara, Ranieri Mazzilli, iria substituí-lo, o moderado líder do governo na Câmara, deputado Tancredo Neves (PSD) – que em 1985 viria a ser o primeiro presidente civil após a era militar, mas que morreu antes de tomar posse – levantou-se e se dirigiu ao presidente do Congresso aos gritos: "Canalha, canalha!".
  • De acordo com Almino Affonso, o anúncio também motivou a ira de outro deputado, Rogê Ferreira, do Partido Socialista Brasileiro (PSB), que partiu para cima de Moura Andrade.
  • "Alto, hercúleo, [Rogê Ferreira] consegue aproximar-se daqueles seguranças do Congresso, afasta-os, aproxima-se do Moura Andrade e dá duas cusparadas, que eu passei a chamar de 'cusparadas cívicas'", declarou Almino Affonso.
  • Emílio Gomes, 89 anos, se qualifica como um deputado de "primeira viagem" em 1964. Filiado ao PDC, integrava a bancada do Paraná na Câmara. Ele disse que, como novato, acreditou na época que Moura Andrade tivesse adotado "uma posição legal". "Eu acreditei que fosse verdade. Se ele estava falando, é porque tinha algum documento", declarou.
  • Ao final da sessão, Gomes disse ter passado por momentos de tensão e medo depois que Moura Andrade convidou um grupo de parlamentares – entre os quais ele estava – para se dirigir ao Palácio do Planalto a fim de, ainda na madrugada, dar posse a Ranieri Mazzilli.
  • "Nós saímos a convite dele [Auro de Andrade] pela garagem, que tem uma saída que sai do Senado direto para o Palácio do Planalto. Atravessamos para assistir a posse do novo presidente. Quando estávamos descendo a rampa [...], o pelotão ali de guarda não sabia do que se tratava. Eu só sei que um camarada pegou a metralhadora e apontou, e eu pensei: 'Pronto, acabou a minha valentia'. O que eu faço? Eu não tive ação nenhuma. Fiquei parado, como os outros pararam. Quem estava próximo era o coronel Costa Cavalcanti, que conhecia bem o linguajar militar. Então, ele gritou: 'Não atire, chame o seu oficial de dia'. Veio o oficial de dia, eles conversaram. Então, eles se afastaram e nós entramos."
  • A revisão do ato de Auro de Moura Andrade se deu somente quase 50 anos depois. No dia 21 de novembro do ano passado, o Congresso Nacional anulou a sessão legislativa que destituiu o ex-presidente da República João Goulart do cargo – uma decisão com valor simbólico, a fim de se retiirar o caráter de legalidade do golpe militar de 1964. ( fonte: G1)